De acordo com os dados da ONG inglesa Oxfam, uma
elite (a do 1%) deterá em breve (2016) riqueza equivalente a 99% da população
mundial (site do Estadão19/1/15). A riqueza se concentra cada vez mais no
mundo todo (depois de Piketty não há mais como negar isso). A riqueza, no
entanto, é a eficácia e a virtude do capitalismo. Não há como impedir que se
ganha dinheiro com o seu trabalho, sua invenção ou seu empreendimento. O
problema está na desigualdade extrema, que é seu vício (seu lado sombrio). Um
segundo problema é que o poder do dinheiro não se limite ao mercado e ao mundo
econômico. Sabe-se que os ricos são dominantes não apenas pelo seu poder
econômico, sim, porque dominam também o poder político,
"comprando-o", seja por meio da corrupção (que estrutura a
criminalidade organizada político-empresarial chamada P6: Parceria
Público/Privada para a Pilhagem do Patrimônio Público), seja por meio do
"financiamento" das (caríssimas) campanhas eleitorais. Exemplo:
somente as empreiteiras investigadas na Operação Lava Jato doaram, juntas, pelo
menos R$ 484,4 milhões a políticos e partidos nas eleições de 2014. É o que
mostra levantamento do jornal O Globo (citado pelo site do Congresso em
Foco). Segundo a reportagem, a Odebrecht, a OAS, a Andrade Gutierrez, a Queiroz
Galvão, a UTC, a Camargo Corrêa, a Queiroz Galvão, a Engevix, a Mendes Junior e
a Toyo Setal repassaram somas vultosas a candidatos e direções partidárias por
meio de subsidiárias, cujas ações são controladas pela matriz do respectivo
grupo. Financiamento de campanhas + superfaturamento de obras = corrupção (ou
seja: cleptocracia, que contribui para a democracia de fachada).
A desigualdade extrema gera uma infinidade de
distorções no funcionamento das sociedades (veja Piketty). Uma delas consiste
no "sequestro" da democracia, ou seja, o poder econômico
"compra" o poder político, forjando assim uma "democracia de
fachada", onde quem manda verdadeiramente são os "grandes
eleitores", os financiadores, não o povo. Democracia é o governo pelo
povo. Uma das suas distorções reside na plutocracia (governo das grandes
riquezas). Outra mácula recai sobre a cleptocracia (Estado cogovernado pelos
ladrões). Quando a plutocracia (riqueza) cogoverna por meio da fraude, da
corrupção e outros ilícitos, se torna cleptocrata. Os escândalos da Petrobras e
do metrô de SP constituem exemplos de cleptocracia (assim como da criminalidade
organizada P6). Comprovam que o Estado também é governado por ladrões. O
"financiamento" das campanhas está na antessala da cleptocracia.
Todos os benefícios e privilégios decorrentes dele (licitações fraudulentas,
superfaturamentos etc.) configuram atos de cleptocracia. O esforço que as
massas divididas empenham umas contra as outras (luta entre os grupos não dominantes)
resulta quase sempre inútil, quando se sabe que o destino do país está nas mãos
de quem domina. Enquanto os de baixo se digladiam e se odeiam (ou até mesmo se
matam), os de cima financiam os políticos de todos os maiores partidos,
manobram as leis e, em consequência, a Justiça, e promovem a distribuição da
riqueza para eles.
A profunda e até repugnante desigualdade (sobretudo
nos países de capitalismo extremamente injusto, como o Brasil) vem destruindo
não só a eficácia do constitucionalismo democrático de direitos e deveres,
senão também a própria democracia (cada vez mais "comprada",
portanto, cada vez mais corrompida). Diante da concentração exagerada das
riquezas e das rendas, as classes médias, em muitos países, estão sendo
rebaixadas (praticamente no mundo todo). Os pobres estão indo para a miséria e
os miseráveis se convertendo em indigentes ou famintos. Não há ambiente e
terreno mais propício para o afloramento de alguns venenos destrutivos da
sociedade, como o do populismo, o da discriminação, o do ódio aooutro (ao
inimigo), o da violência, o da intolerância e os dos sectarismos. Na democracia
representativa cada cidadão tem direito a um voto. Cada cabeça um voto. Esse é
o discurso legitimador do sistema. Nas democracias conspurcadas (de fachada),
mandam na verdade os grandes eleitores, saídos da elite econômica dominante. A
elite que manobra, manipula e monopoliza a política, o mercado e a cultura faz
da democracia e dos eleitores um joguete (mero instrumento) à disposição dos
seus interesses.
Da redação do Jornal da
Parnaíba
Por: Luiz Flávio Gomes
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