O povo, ressentido com a forma como se dera a transição “no tapetão”,
desejava uma espécie de desagravo. Bastava que as oposições se unissem e
a vitória parecia certa. Foi nesse cenário de previsibilidade que surgiu,
discreto, o nome que mudaria para sempre a história política do estado:
Wellington Dias.
O fenômeno Wellington Dias
Até então, o PT no Piauí era uma legenda de militância minoritária,
confinada a redutos acadêmicos e sindicais. Seus principais nomes , José
de Ribamar - primeiro candidato do PT ao governo do estado, Antônio José
Medeiros, Nazareno Fonteles, João de Deus e Francisca Trindade entre outros,
tinham prestígio intelectual, mas não voto. O partido raramente ultrapassava
20% na capital e era praticamente irrelevante no interior.
Mas Wellington Dias representava algo diferente. Funcionário da Caixa
Econômica Federal, sindicalista e político de trajetória ascendente,
vereador, deputado estadual e federal, sem jamais ter perdido uma
eleição, ele unia disciplina partidária, retórica popular e uma serenidade
calculada. O plano inicial do PT era modesto: lançar Wellington ao Senado,
apoiando Roberto John para o governo. Mas o destino se escreve nas hesitações
dos grandes e as elites piauiense hesitaram novamente.
A eleição perdida pelas elites
Firmino Filho, o nome mais competitivo das oposições, recuou. A versão
corrente é que a direção nacional do PSDB, pediu que ele permanecesse em
Teresina para garantir o projeto tucano em nível nacional. Outra versão,
talvez a mais plausível, era o receio de entregar a prefeitura para
Marcos Silva, então vice prefeito e filho do ex governador Alberto Silva.
Muitos ainda se lembram do slogan da campanha de Firmino em 2002.
"Quem atrasa, nao adianta". Era uma referência direta ao atraso nos salários
dos servidores do estado e a completa desorganização financeira deixada por
Alberto ao seu sucessor Freitas Neto. O receio de Firmino era que o PMDB
desmontasse a única estrutura política consolidada do PSDB no estado,
justamente na capital com praticamente um quarto do eleitorado piauiense.
Muitos entendidos de política acreditam no entanto que Firmino recuou com
receio de enfrentar Hugo Napoleão, preferindo se aliar ao governador indicando
Fernando Said como seu companheiro de chapa. A ideia era simples: Hugo não
poderia disputar a reeleição, abrindo espaço para Fernando completar o
mandato, sendo ele Hugo, candidato ao senado federal e Firmino depois de
cumprir todo o mandato de prefeito sairia candidato ao governo apoiado pelo
estaf governamental. Seja qual for a razão, sua desistência foi um erro
estratégico monumental.
Com Firmino fora, as oposições buscaram alternativas. O senador Freitas
Neto, outro nome de peso e de passado impecável, também declinou. Amigo e
aliado de Hugo Napoleão, preferiu preservar laços pessoais e como disse o
próprio Senador Freitas Neto, "estava gostando e preferiu disputar a
reeleição para o Senado Federal". Admite no entanto que não aceitar
disputar o mandato de governador em 2002 foi um dos grandes erros de sua carreira
politica. E foi justamente nesse vazio que o PT encontrou sua brecha
histórica.
Wellington Dias, sem nada a perder, aceitou ser candidato ao governo.
Tinha o discurso da esperança, a imagem da humildade e a bênção involuntária do
ressentimento popular contra Hugo Napoleão. O resultado foi avassalador: venceu
em primeiro turno, com uma diferença proporcional jamais superada desde então.
O golpe final havia sido desferido. E as antigas elites, desarticuladas
e paralisadas pela própria vaidade, assistiram sem reação ao nascimento de uma
nova hegemonia política.
A era do petismo e o método do poder
Com Wellington no Palácio de Karnak, o PT inaugurou um novo modo de
governar. Um poder meticuloso, paciente e cumulativo. O partido percebeu que o
segredo da perpetuação não estava na ruptura, mas na ocupação gradual do
Estado.
Assim, distribuiu “ilhas de influência” a aliados eventuais. Pequenas
secretarias, cargos intermediários e repasses para obras de calçamento e
estradas vicinais, o suficiente para alimentar o clientelismo municipal,
mas nunca para formar novas lideranças autônomas.
A elite política local, acostumada à fartura dos cofres e ao conforto do mando,
aceitou resignada as migalhas do banquete.
O resultado foi previsível: enquanto o PT consolidava sua base de poder
no interior e nas instituições, os antigos caciques definhavam politicamente.
Hugo Napoleão, Freitas Neto, Heráclito Fortes, Mão Santa e outros, todos em
maior ou menor grau, sucumbiram à irrelevância. Alguns, pela idade e pelo
tempo; outros, pela ingenuidade de acreditar que ainda eram protagonistas.
O partido havia compreendido o jogo com clareza cirúrgica: não
precisava destruir as elites bastava neutralizá-las.
A nova geração e o cerco final
O tempo passou. Vieram novas gerações, novas fachadas e velhas
estratégias. O jovem governador Rafael Fonteles, herdeiro direto de Wellington
Dias, é hoje a face moderna do mesmo projeto de poder. Articulado, tecnocrático
e ambicioso, ele representa o que o petismo aprendeu de melhor e de pior: a
eficiência administrativa combinada à hegemonia política e mídia. Muita mídia.
Praticamente a principal fonte de sustentação financeira dos principais e de
maior alcance sistemas de comunicação do estado. Para o restante de
blogs, portais e redes sociais com alcance no território piauiense a ordem é
pagar pela informação de interesse do governo. A oposição fica restrita a
alguns gatos pingados.
Fonteles não esconde seus planos. Quer consolidar sua própria geração
no comando, desalojar o MDB de Marcelo Castro e Themístocles Filho, e, mais
adiante, libertar-se da sombra de Wellington. O criador que começa a
pesar sobre a criatura.
Enquanto isso, nomes como o do deputado federal Júlio César Lima, um
dos poucos com resultados concretos para mostrar, ainda sobrevivem pela
credibilidade, mas sob o risco constante de também serem engolidos pelo mesmo
sistema que tudo absorve.
O PT do Piauí construiu um poder que se retroalimenta, fechado sobre si
mesmo, ideológico apenas na aparência, mas pragmaticamente absoluto na prática.
Entrega o mínimo necessário, distribui as sobras e mantém o essencial sob controle.
E como toda hegemonia, sua queda, quando vier, não virá de fora, mas de dentro para fora. A decomposição será orgânica, silenciosa, e começará exatamente onde o partido sempre foi mais forte: no próprio ventre do poder.
Fonte: Arthur Feitosa | gazetahora1

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