Jurado disse que estudante não poderia ganhar concurso por ser "morena" e não negra.
Macyrajara Freitas. (Foto: Arquivo Pessoal) |
A miss relata que disputou com outras sete concorrentes e ficou em
segundo lugar. Logo após o resultado, um dos jurados pediu o microfone e teria
tentado argumentar para o público que Macyrajara não havia levado o maior
prêmio por ser "morena" e não negra, por ter o cabelo liso.
"Na hora que a Macyrajara entrou, eu falei: ela não é negra, é morena.
Existe a diferença da negra pra morena, a morena tem o cabelo liso e ondulado.
E os meninos a mesma coisa, existe o negro com o cabelo afro e existe o
moreno", disse o jurado em um vídeo gravado no dia do desfile.
A estudante afirma que se sentiu discriminada pelos comentários feitos
pelo jurado. Mesmo constrangida, a jovem diz não ter conseguido reagir às
declarações e teve de ser defendida pelos familiares que também estavam
presentes no evento. Com experiência em concursos de beleza, a miss revela
nunca ter passado por uma situação semelhante.
"Eu fiquei sem entender, me perguntando se era mesmo aquilo que
estava acontecendo. Todas mereciam ter ganhado, não só pelo cabelo, cabelo não
define nada. Estavam julgando a beleza negra e não o cabelo de ninguém",
destaca.
Macyrajara lembra que esse não foi o primeiro caso de racismo que
sofreu, mas o fato de ter ocorrido em um evento com a presença de dezenas de
pessoas, a fez se sentir impotente. "Me senti triste pelo meu povo porque
eu tenho certeza que não foi só eu que senti, até porque a população toda se
revoltou, aquele recado não foi só pra mim. Já sofri racismo, eu sofro racismo
toda hora, mas não nesse nível, pra cidade toda ouvir", lamentou.
A fala do jurado incorre na discussão a cerca do colorismo, termo
utilizado para diferenciar várias tonalidades da pele negra, do tom mais claro
ao tom mais escuro, bem como tipificar as características que seriam inerentes
à pessoa negra, caracterizando como "não negro" aquelas que mais se
assemelhariam ao branco. Pela ótica do colorismo, para se enquadrar como negro,
além da cor da pele mais escura, a pessoa também precisaria ter determinados
traços físicos. Por isso, o colorismo é considerado como uma forma de preconceito
racial.
Prefeitura repudia fala de jurado
A Prefeitura Municipal de Luís Correia se manifestou sobre o ocorrido e
saiu em defesa da estudante Macyrajara Freitas. Em nota, o órgão
classificou o caso como preconceito racial e "tentativa de
tipificação e padronização da beleza de pessoas negras".
"Discursos como este, proferidos na noite de ontem (20), não
representam de forma alguma o entendimento da organização da "I Semana da
Consciência Negra" e do "Concurso Beleza Negra 2021", que do
planejamento à realização do evento, objetivou proporcionar à sociedade
luiscorreiense o conhecimento sobre a história e a triste realidade racista
estrutural vivida e enfrentada pelo povo negro neste país", disse a
prefeitura.
A prefeitura destacou ainda a importância de nos posicionarmos contra
atos que buscam padronizar e tipificar a diversidade, a beleza e o próprio
negro e buscarmos entender as reivindicações históricas do movimento negro.
"Assim, pessoas brancas poderão entender definitivamente que o racismo
estrutural se manifesta não somente através de xingamentos ou agressões
físicas, mas também quando um não negro se apropria de um lugar de fala que não
lhe pertence para nomear, caracterizar ou definir o negro", disse.
O órgão finalizou ainda defendendo que na sociedade em que vivemos não
basta não ser racista, é preciso promover o antirracismo. "Ressaltamos que
esse foi o propósito fundamental do evento realizado e que continuaremos
promovendo, no âmbito da cultura e das demais instâncias da administração
municipal, o combate direto a toda e qualquer forma de discriminação",
finalizou a nota.
Por: Nathalia Amaral / Portal o Dia
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