A delegacia irá assumir as investigações de feminicídio
nos municípios de Guadalupe e Cajueiro da Praia nos próximos dias e está sendo
subutilizada por falta de equipe e estrutura.
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Delegada Luana Alves. (Foto: Arquivo O Dia) |
Inaugurada em junho de 2016, a Delegacia de
Feminicídios funcionaria como um dos principais núcleos do Departamento de
Polícia de Combate à Violência Contra a Mulher, vinculado à Secretaria de
Segurança Pública do Piauí (SSP/PI). Contudo, na prática, a realidade é outra.
Por falta de estrutura e de equipe, a delegacia está sendo subutilizada.
Atualmente vinculada à Delegacia Especializada de
Atendimento à Mulher (DEAM), localizada no Parque Piauí, zona Sul de Teresina,
a Delegacia de Feminicídios possui apenas uma delegada e três policiais civis
para investigar e cumprir os mandados de prisão dos homicídios caracterizados
pela violência de gênero, que têm como vítimas meninas, mulheres, travestis e
mulheres transexuais. Com isso, alguns crimes de feminicídio têm sido
repassados para a delegacia de Homicídios, como é o caso da morte da
estudante Camila Abreu, assassinada pelo capitão da PM Allisson Wattson em
outubro de 2017.
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Camilla Abreu foi assassinada pelo namorado em outubro de 2017. |
De acordo com a titular da delegacia de
Feminicídios, a delegada Luana Alves, o núcleo irá assumir duas investigações
nos próximos dias. Ambos os casos ocorreram no interior do estado, nos
municípios de Guadalupe e Cajueiro da Praia. "Eu assumi a delegacia com o
objetivo de fazer as investigações com a perspectiva de gênero. Queremos levar
os casos ao júri e que os jurados entendam que aquela mulher morreu por ser
mulher", afirma a delegada.
No entanto, por falta de equipe e estrutura, a nova
delegada ainda não conseguiu assumir de fato as investigações. “Nós estamos
tentando viajar para Guadalupe, porque a equipe de Guadalupe é muito reduzida,
o delegado está sozinho na cidade. Contamos com a parceria da Delegacia de
Homicídios e com os delegados do interior. Eles serão nosso braço nessas
investigações”, enfatiza a delegada.
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Estudante Iarla Lima foi morta pelo namorado em junho de 2017. |
A expectativa é que a delegacia passe a ter uma
sede dentro da Delegacia de Homicídios até março deste ano. Caso a medida seja
implantada, todos os crimes de feminicídio do Estado passarão a ser
investigados pelo núcleo, que contará com mais pessoal e poderá utilizar a
estrutura da Homicídios, atualmente coordenada pelo delegado Francisco Costa
Baretta.
Sobre a quantidade de investigações de feminicídios
em andamento, a reportagem do O Dia entrou em contato com a Secretaria de
Segurança Pública do Piauí que informou que a prioridade atual é “manter sob
sigilo através de uma política implantada pela atual gestão para não atrapalhar
o processo e não estimular novos casos”.
O órgão também informou que os crimes foram e estão
sendo investigados pelo Núcleo Policial do Feminicídio, e citou o caso da
estudante de direito, Iarla Lima, morta pelo namorado em junho do ano
passado. Somente em 2017, a Secretaria de Segurança Pública registrou 24 casos
de feminicídio no estado.
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Maria José Alves Pereira, assassinada em Cajueiro da Praia (PI) pelo marido durante crise de ciúme. O caso vai ser investigado pela Delegacia de Feminicídio. |
Acolhimento e investigação
Para a advogada Mariana Moura, que atua dando
assistência às mulheres vítimas de violência de gênero, é importante que os
crimes de feminicídio sejam investigados por uma delegacia especializada por
ser um local que irá proporcionar maior acolhimento para as vítimas e seus
familiares. “A existência de mulheres investigadoras lotadas em um espaço que
vai ter um acolhimento diferente propicia que se consiga colher depoimentos
mais objetivos e precisos, e para que as pessoas se sintam à vontade para
falar”, destaca.
No âmbito da investigação, a delegada Luana Alves
explica que o núcleo tem um olhar diferenciado para os assassinatos de
mulheres, para que seja possível identificar as sutilezas do crime, uma vez que
o próprio corpo da vítima diz muito sobre a motivação, o que muitas vezes passa
despercebido pela investigação comum.
“Analisando alguns inquéritos de feminicídio, nós
observamos que muitas mulheres são mortas com requintes de crueldade, existe
realmente uma agressividade maior em cima das mulheres. A maioria das mortes de
mulheres é feminicídio, não é violência urbana, a mulher não está sendo morta
porque não quer dar o celular, a mulher está sendo morta porque é mulher,
porque está morando com o agressor ou porque está desafiando a sociedade”,
explica.
Machismo
Para a advogada Mariana Moura, tratar os casos de
feminicídio como crimes motivados pelo desprezo ou o sentimento de perda do
controle e da propriedade sobre as mulheres é de suma importância. A
tipificação do crime auxilia nas políticas públicas voltadas para punição aos
agressores e para medidas de prevenção e conscientização da população sobre as
relações machistas da sociedade brasileira.
“A mulher está morrendo e a motivação está
relacionada à misoginia e a todo esse ódio que foi construído contra o ser
feminino. Quando não damos destaque para isso, não especificamos esse crime e
as tentativas desse crime, a gente joga dentro de um quadro geral em que é difícil
ter um número concreto para saber que medidas podem ser adotadas, e com isso
acaba invisibilizando que esse é um problema grande”, alerta a advogada.
Por: Nathalia Amaral/O Dia | Edição: Jornal da
Parnaíba
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