Um lugar só é considerado como tal a partir do
momento que alguém dá um significado a ele. Sendo assim, a significação dada a
um espaço varia de acordo com as pessoas que o habitam, frequentam ou aqueles
que só ouviram falar. (Aneliza de Brito Vaz)
A imagem [ao lado] é uma representação da fachada
da boate estrela do ponto 4, espaço onde funcionou por quase duas décadas o
cabaré da Munguba. Atualmente o espaço serve [servia, pois ruiu] para o
encontro de boêmios e outras pessoas, não servindo, portanto, como lugar de
prostituição. Embora tenhamos apresentado o bairro que guarda em si
personagens, espaços, lembranças e histórias da prostituição e dos cabarés na
beira do cais de Parnaíba, cabe uma pergunta: e o termo Munguba de onde vem, o
que ele representa? Munguba – árvore da flora maranhense, também conhecida por
mungubeira, o nome vem do tupi môguba (dicionário novo Aurélio). Depois passou
a receber a denominação de Rua dos Barqueiros devido à presença constante
destes trabalhadores na quitanda do seu Zé Fenelon.
Esta rua nesgada e curta tem uma história alegre, salpicada de lances pitorescos, com brigas e muito pau. Depois de varar o descampado da Quarenta, a rua teve início na quitanda do Zé Fenelon. Deus te guarde, era o nome da quitanda do Zé Fenelon. Era uma espécie de quitanda - loja, tudo ali tinha, desde fumo às calças de brim, desde a cachaça ao vestido de chita. Diariamente se aglomeravam os valentes barqueiros do Parnaíba que iam se abastecer de comestíveis e bebidas para as suas viagens do dia-a-dia na carreira do rio. Daí nasceu o seu nome: Rua dos Barqueiros. Assim como Quarenta foi o primeiro nome do atual bairro Mendonça Clark, o mesmo ocorreu com a Rua dos Barqueiros, onde estava localizada a Munguba.
Esta rua nesgada e curta tem uma história alegre, salpicada de lances pitorescos, com brigas e muito pau. Depois de varar o descampado da Quarenta, a rua teve início na quitanda do Zé Fenelon. Deus te guarde, era o nome da quitanda do Zé Fenelon. Era uma espécie de quitanda - loja, tudo ali tinha, desde fumo às calças de brim, desde a cachaça ao vestido de chita. Diariamente se aglomeravam os valentes barqueiros do Parnaíba que iam se abastecer de comestíveis e bebidas para as suas viagens do dia-a-dia na carreira do rio. Daí nasceu o seu nome: Rua dos Barqueiros. Assim como Quarenta foi o primeiro nome do atual bairro Mendonça Clark, o mesmo ocorreu com a Rua dos Barqueiros, onde estava localizada a Munguba.
[...] teve sua origem no arruado de casas da
“Quarenta”, lugar “quente”, que não tinha dia nem hora pra começar o fuzuê,
principalmente quando as festas vinham do dia anterior. Sempre foi uma rua
nesgada, começando pelo estabelecimento de seu Zé Fenelon, hoje casa abandonada
que serviu que quitanda-loja, onde eram fornecidas as mercadorias a centenas de
embarcadiços, desde os fumos de mascar até as calças de brim JOFRE com atracas
de pano reforçado e de fivelas de latão à moda de retranca que segura o cintão
porta faca. Depois por causa de alguns pés de mangubeira plantadas à margem das
calçadas das meia-águas, que eram muitas, passaram a chamar o local de
“MONGUBA”, superando mesmo o cognome de “Quarenta” ou Antônia “quorenta”, que
era o preço porquanto o “freguês” tinha de dar à filha por uma visita rápida.
Também ainda existe (existia) uma casinha onde mora (morava) a primeira mulher
que habitou o mundo – E-V-A. Trata-se de um telheiro mandando fazer às pressas
para socorrer a Eva, rapariga velha habitante há muitos anos nas imediações da
Munguba. O Coronel Sebastião Furtado mandou fazer a tegúrio e deu pra Eva morar
até morrer. Mas a Rua dos Barqueiros é de fato o nome apropriado que ela
merece, porque lá é que o aglomerado de embarcadiços se reunia, tanto para
comprar como para dançar e beber nos dias do cotidiano. Não foi, portanto a Rua
do Tamancão que erroneamente se dizia chamar rua dos barqueiros. A referência
acima evidencia não, apenas, a origem da rua dos barqueiros, seu cotidiano,
alguns de seus habitantes e espaços. Percebemos que sua história confunde-se
com a do próprio bairro. Percebemos que o espaço que serviu para a prática da
prostituição surgiu de forma lenta e gradual estando sua origem intimamente
relacionada às festas oferecidas pela Munguba através da boate Estrela do Ponto
4, que surgiu provavelmente por volta de 1940. A sociedade parnaibana nutria
preconceito pelo lugar. O ambiente era frequentado por pessoas de pouca
instrução educacional, homens que desenvolviam trabalhos braçais e rústicos,
desconhecendo os princípios de moral e bons costumes tão apregoados pala
sociedade de Parnaíba, preocupando-se apenas com os desfrutes das festas e mulheres
oferecidas pela Munguba.
Como a maioria das cidades portuárias, e Parnaíba
não há de ser esta exceção, geralmente existe próximo à beira dos rios uma
região onde se desenvolvia a prostituição. E essa atividade de comércio do
corpo é alimentada pelos homens que viviam do mercantilismo frequente no cais.
Entre os frequentadores mais assíduos da beira do cais parnaibano, encontramos
a presença dos vareiros.
“era vareiro [...] aqui dava muito era vareiro!”
[...] o “vareiro”, propriamente dito, foi a pedra
angular na formação do império comercial desta região, cabendo-lhe por isto
mesmo lugar de destaque no encadeamento da ação aglutinadora em que de pronto
se transformaria apesar de nenhuma qualidade de sentido intrinsecamente
executivo por ele demonstrada, por motivos óbvios, o homem fluviário estava
sempre na linha de frente, garantindo sua presença como fonte alimentadora de
energia física na luta com suas barcas e nalguns casos passando até mesmo
despercebido no torvelinho de sua faina diária... Era o vareiro que de repente
se via banido do meio ambiente em sempre viveu para, sem qualquer alternativa,
outra coisa não ter que fazer senão estirar a mão à caridade pública, já pela
força do desemprego, já pela perseguição da fome que o acassoava de todos os
lados e mais os filhos espúrios, herdados na noite negra de seu destino.”
Percebemos o vareiro como um personagem importante na composição das tramas e
urdiduras que envolvem o espaço do cais. O cotidiano do vareiro era assinalado
pela presença marcante nas festas, na relação com as prostitutas, no trabalho
diário, nos confrontos violentos com a polícia provocados pelas bebedeiras
típicas destes ambientes noturnos na beira do cais, onde criam-se
representações obre eles.
As lutas constantes entre embarcadiços e policiais
marcaram época na então florescente cidade de Parnaíba, o único centro
exportador do Piauí. Não existia, pode-se dizer razão profunda para a
continuidade da guerra acirrada entre as duas classes, quando a causa principal
das rusgas se assentava unicamente no desforço de cada lado se julgava no
direito de tomar. Era a honra que precisava ser lavada, às custas do facão
“comblain”, por um lado, e por outro, a troco do pau e da faca marinheira, para
tirar o ranço do “canela preta féa da puta”.
Esta representação nos permitiu visualizar como se
davam as relações sociais noturnas entre as pessoas mais simples e os que
representam o poder e a ordem estabelecida socialmente, enfim, este é apenas um
pedaço do cotidiano vivido no cais do Rio Igaraçu.
Ainda na região portuária percebemos que o lugar
mais famoso de Parnaíba e que constantemente tinha presença marcante do vareiro
era a Munguba, onde existiam inúmeras casas, constando em seu interior pequenos
quartos que eram alugados para as prostitutas servindo para a prática do “amor
livre” e ao conjunto dessas casas deu-se o nome de Munguba. Rago evoca o
pensamento do artigo do jornal A Terra Livre, [de] 02/08/1907, que menciona o
seguinte sobre o “amor livre”: O amor livre não significa a apropriação comum
da mulher, mas quer dizer: a liberdade ilimitada para a mulher, como para o
homem, de amar quem quiser a liberdade de concentrar sobre uma pessoa, antes
que sobre outra, todos os afetos. Quer dizer noutros termos: subtrair-se a
terrível tirania dos pais, dos parentes e dos seus substitutos, que querem
impor-lhes um marido do gosto deles, para amar livremente objeto dos seus
sonhos. A referência ao amor livre apresentado no texto acima recomenda que
devem escapar a tirania de seus parentes e ter a possibilidade de escolher
livremente seu amado.
Extraído da dissertação de Mestrado em História do
Brasil “Memórias do Cais: Parnaíba, a cidade, o rio e a prostituição
(1940-1960)” de Erasmo Carlos Amorim Morais, orientação da Profa Dra. Maria do Amparo
Borges Ferro. Universidade Federal do Piauí, 2012.
Um comentário:
Ah que saudade da Munguba!Meu avô vendia colchões de junco e de linho para as moradoras de lá
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