terça-feira, maio 25, 2010

Famílias atingidas pela tragédia de Cocal estão há um ano sem ter onde morar

O nome dele é José Ivan do Nascimento, mas no povoado Frexeiras da Estação, na zona rural de Cocal, todo mundo só o conhece como Iran. Casado com a dona-de-casa Sandra Maria de Sousa e pai de quatro filhos, o lavrador de 38 anos não sabe o que é dormir em casa há quase um ano. Morador de uma das localidades atingidas e devastadas pelas águas da Barragem Algodões, ele e mais três famílias permanecem instaladas sob o teto da única escola da região.

Em um espaço de pouco mais de 20 metros quadrados, 16 pessoas dividem espaço com colchões, sofás e o que mais deu para salvar da onda que destruiu o lugar. "Até pouco tempo, eram cinco famílias", recorda sua sogra, Maria do Carmo.
 Antes da tragédia do dia 27 de maio de 2009, Iran, a esposa e os quatro filhos moravam em uma casinha de dois quartos, sala e cozinha, e viviam do que era produzido na roça e de um ou outro bico como servente. Mesmo um ano depois do rompimento da parede da Barragem Algodões, muita coisa não voltou ao normal para o casal. Além de continuar sob o abrigo da escola do povoado, ele ainda não retomou o seu trabalho na lavoura. "Estou preparando um roçado do outro lado do Rio Pirangi, no São Domingo.Até lá, vou vivendo dos bicos que aparecem como servente de pedreiro", conta, diante do que um dia foi a sua moradia.

Iran não foi o único a perder quase tudo quando as águas da Barragem Algodões invadiram Frexeiras da Estação por volta das 22h30 daquele 27 de maio. O também lavrador Francisco das Chagas Alves da Silva perdeu tudo em casa, além do que cultivava na roça e dos animais que criava. Na comunidade onde os dois moravam, aliás, todas as famílias ficaram desabrigadas depois do rompimento da parede da represa. O estrago poderia ter sido maior se boa parte dos moradores da área não tivesse conseguido refúgio em uma casa localizada na área mais alta da região. "Lá (nessa casa), amanheceram 63 famílias só de Frexeiras da Estação", conta o senhor de 60 anos.

Em Frexeiras da Estação, um ano após o ocorrido, já é possível observar sinais de reconstrução. Muita gente já reconstruiu suas casas e o cotidiano parece estar voltando ao normal dia após dia. Mas muita coisa ainda faz lembrar o povoado onde após a passagem das águas da Barragem Algodões.

Apenas a escola e a igreja mantiveram-se de pé. Quem não teve a oportunidade de reconstruir na própria localidade o que perdeu na tragédia, recebeu casas na Agrovila Olho D'Água, erguida com a ajuda do suor de Iran e destinada às famílias que perderam tudo na região. Mas o que era para ser uma boa notícia continua sendo uma dor de cabeça. As quatro famílias ainda hoje abrigadas sob o teto do colégio do povoado nunca mudaram-se para o novo endereço porque o local enfrenta problemas de abastecimento de água.

Francisco das Chagas também sofre na pele o problema. Embora tenha recebido uma casa na Agrovila Olho D'Água, ele continua morando em Frexeiras da Estação, em um barraco que divide com a sua atual mulher e mais cinco netos. "Sem ter água, como é que a gente vai cuidar desse monte de menino?", questiona, revelando problemas de abastecimento de água na localidade onde a Defesa Civil Municipal garante ter solucionado todas as dificuldades.

Com problemas de abastecimento em Olho D'Água, qualquer morador da agrovila é obrigado a fazer uma extenuante caminhada para conseguir a água que será utilizada para beber, tomar banho e lavar roupas, panelas, pratos e talheres. Há quem diga que é possível encontrar água a meio quilômetro da localidade, mas há quem garanta que achar abastecimento de verdade por aquelas bandas só caminhando quase uma légua.

Problemas estruturais nas quatro agrovilas construídas para receber as famílias que tiveram perda total com o rompimento da Barragem Algodões, aliás, é algo bem comum. Além de Olho D'Água, Boíba, Jacaré e Marçalina possuem uma ou outra dificuldade, especialmente no que diz respeito ao abastecimento de água e energia elétrica.

Sem água potável e nem energia elétrica, população de Cocal espera por dias melhores.

Um ano após o rompimento da barragem Algodões I, ações de recuperação e prevenção de novos desastres em Cocal da Estação ainda são insuficientes. Várias famílias não recuperaram seus bens e vivem sem água potável e sem energia. O Governo informou que o conjunto habitacional está em fase de conclusão e agora as casas serão energizadas e terão abastecimento d’ água.

No entanto, quando visitou algumas comunidades, a equipe de O DIA constatou que mesmo com o poço cavado para garantir o abastecimento d’água centenas de famílias estão coletando água em açudes da região ou em carros pipas, que são pagos pela Prefeitura Municipal de Cocal.

“Tem sido um sofrimento tudo isso aqui”, relatou o agricultor Expedido Jorge, sem entender o porquê da instalação da estrutura de energia e água que não funcionam. A explicação é simples e burocrática, conforme o secretário estadual da Defesa Civil, James Alves.

“Temos que cumprir as exigências burocráticas para podermos ligar a energia e o sistema de abastecimento de água”, disse. Segundo ele, a previsão é que até o dia 30 de junho o abastecimento de água e luz nas casas construídas pelo governo seja normalizado. “Houve atraso em algumas obras, mas nos comprometemos em entregar a luz e água no prazo”, ratifica o secretário, acrescentando que ao todo foram liberados R$ 35 milhões para obras de reconstrução e recuperação dos estragos. Pelos dados da Defesa Civil Estadual, cerca de 550 casas populares foram construídas na região.

Uma forma que o poder público estadual encontrou para minimizar as perdas sofridas pelas famílias das principais comunidades atingidas foi a concessão de um benefício no valor de R$ 5 mil para a compra de eletrodomésticos e as mobílias.

De acordo com informações do Governo do Estado, foi liberada uma verba do Ministério da Integração Nacional no valor de R$ 2,2 milhões para compra de geladeiras, fogões e móveis. Para distribuir o benefício, o Estado utilizou o mesmo cadastro feito pela Defesa Civil para prestar assistência emergencial.

Estradas recuperadas, vida retorna ao normal.

Na primeira vez que a equipe do O DIA esteve na cidade de Cocal da Estação, dias após o rompimento da Barragem Algodões, viu um cenário de destruição. Estradas de acesso interrompidas, pequenos cemitérios revirados, animais mortos e plantações completamente destruídas. Ao retornar às comunidades atingidas pelas águas naquele 27 de maio de 2009, a equipe jornalística percorreu parte do trecho a pé, a uma temperatura próxima dos 40 graus.

Nos acessos às comunidades, toda a estrutura viária já foi recuperada, possibilitando a passagem de veículos e motos. No ano passado, foi feita a desobstrução das estradas vicinais alagadas e a criação de acessos alternativos às localidades, já que algumas estradas simplesmente desapareceram do mapa.

Com a liberação e reestruturação dos acessos, as comunidades Algodões, Franco, Cruzinha, Dom Bosco, Boíba, Angico Branco, Tabuleiro, Capiberibe, Frecheira da Lama, Olho D’Água e Frecheira de São Pedro tentam aos poucos retornar à normalidade. No entanto, ainda é possível perceber em algumas residências a marca do nível que a água atingiu.

Fonte: Flávio Meireles e Mayara Bastos-Jornal O Dia

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