Tatiana Johnsen e Denny Ottani |
Faz quatro anos que Tatiana Johnsen e Denny Ottani
chegaram pela primeira vez em Barra Grande, no Piauí. O amor pelo recanto foi à
primeira vista.
Poucos meses depois, voltaram na busca de um
terreno, já pensando em, num futuro próximo, se estabelecer nessa região de
tranquilidade e natureza, deixando para trás a ruidosa cidade que moravam: São
Paulo.
Há pouco menos de dois anos que esse futuro chegou
para os dois!
BioConstrução BGN 3O casal partiu da capital
paulistana para Barra Grande e percorreu os 3.049 Km em sua Kombi viajante,
pintada com a natureza e carregada de sonhos, para começar a maior aventura de
suas vidas: a construção de um hostel ecológico utilizando as técnicas de
BioConstrução e de Permacultura como base para o projeto.
Denny Ottani e Tatiana Johnsen foram entrevistados
pelo nosso parceiro Juan Carlos Echeverry, especialmente para o Barra Grande
News.
Barra Grande News: O que significa a palavra
BioConstrução e como vocês conheceram essa técnica?
Denny Ottani e Tatiana Johnsen: BioConstrução
significa construir algo onde a preocupação ecológica é o fator que direciona o
uso das técnicas aplicadas, aproveitando os recursos locais para diminuir o
impacto no meio ambiente e se possível, reciclando resíduos. É importante
ressaltar que mais que técnicas, a construção é o relacionamento dos seres
humanos com os materiais que a natureza nos oferece para transforma-los em
obras.
É a possibilidade de fazer uma casa ou qualquer
outro projeto de infraestrutura com as mãos, terra, palha, madeira, areia e
outras matérias primas de origem natural, além de disposição, vontade, amor e
preferivelmente… outras pessoas. Isso é BioConstrução.
Instituto de Permacultura da Manta Atlântica |
Nosso primeiro contato com a BioConstrução e a
Permacultura foi no “Instituto de Permacultura da Manta Atlântica” (IPEMA), em
Ubatuba(SP), onde participamos de um curso de imersão em BioConstrução. Temos
esse curso como um divisor de águas em nossas vidas, pois foi lá que refletimos
sobre a nossa responsabilidade ecológica e social, do impacto do nosso consumo
e da nossa forma de viver, além de conhecer pessoas muito interessantes e com
um estilo de vida muito mais agradável, onde a satisfação está nas coisas
simples da vida.
D.O e T.J: A ideia de que seria um hostel surgiu
durante uma viagem como mochileiros, que fizemos pela Bolívia, Peru e Chile.
Nessa viagem, conhecemos muitas pessoas dos mais diversos lugares e sentimos
nos hostels um clima agradável de colaboração e compartilhamento que não se vê
em qualquer lugar.
A questão da BioConstrução veio desde o curso que
mencionamos no IPEMA, porém nossa viagem de Kombi teve o propósito de vivenciar
e aprender mais sobre Permacultura e BioConstrução e conhecer algumas
Comunidades Alternativas no caminho. Isso nos motivou e nos preparou para
enfrentarmos esse grande desafio com mais base e conhecimento.
BGN: Como foi o processo de encontrar os pedreiros e o pessoal pra trabalhar? |
D.O e T.J: Esse processo foi muito interessante.
Inicialmente, encontramos resistência para construir com estas técnicas por
parte dos pedreiros mais experientes da alvenaria da região.
Então, as circunstancias se derem para propor ao
ajudante (Júlio Cesar Oliveira – Julinho) do marceneiro que estava construindo
a estrutura, para nos ajudar e capacitá-lo nas técnicas de BioConstrução. Ele
aceitou e ali já tínhamos o primeiro “bioconstrutor” para formar”. O seguinte
foi um olhar e sentir as capacidades de um rapaz alegre e bem interessado
(Jerfesson Lima Alves – “Perninha”) que entregava água no depósito de bebidas,
para propor o mesmo. Mais um pra a equipe! O terceiro (Jaílson – “Bandinha”)
foi pela sugestão dos dois primeiros e os seguintes foram amigos deles mesmos
que vinham ajudar na obra e demostraram interesse em nosso projeto.
Adicionalmente estavam os voluntários de muitas
nacionalidades que chegarem para nos ajudar a partir do site www.workaway.com,
especializado em encontrar voluntários para ajudar em projetos diversos pelo
mundo.
BGN: Como foi o processo de capacitação da equipe? |
Assim, chegamos a ter mais de 15 pessoas
trabalhando em conjunto e mais de 50 que participaram da obra. Aprendendo,
ensinando… mas sobretudo COMPARTILHANDO.
D.O e T.J: Não podemos falar da capacitação sem
deixar de contar como conhecemos os bioconstrutores que nos ajudaram nas mais
diversas etapas do projeto.
Foi na primeira parada da viagem de Kombi, no
“Ecoetrix”, em São Tomé das Letras(MG), onde tivemos a sorte de conhecer
algumas pessoas que foram fundamentais no projeto e na execução do mesmo. São
eles: Cesar Augusto da Costa, “Gugu” (Arquiteto da Obra), Flávio Duarte e Bruno
Azevedo, da BioHabitate, e Hélio Athayde. Todos eles bastante ligados em
BioConstrução e com bastante vivências de capacitação nessa técnica.
Quando conhecemos o trabalho do Gugu, ficamos
maravilhados: construções que saem do padrão e nos fazem refletir sobre a
estética e a harmonia dos ambientes na arquitetura. Fechamos de fazer o projeto
com ele e também de nos ajudar com a capacitação da equipe. Foi ele que
ministrou o 1º Curso de BioConstrução, onde foram passadas as seguintes
técnicas: Parede de Taipa (Pau-a-pique), Ferro Cimento, Parede de Garrafas Pet
e Parede de Garrafas de Vidro.
BGN: Como foi o processo de capacitação da equipe para construção das casas? |
Nosso contato com os demais permaneceu ligado e as
coincidências da vida trouxeram o pessoal da BioHabitate para uma obra de
HiperAdobe em Parnaíba(PI), o que casou perfeitamente com nosso projeto. Assim
montamos o 2º curso de BioConstrução, com a técnica de Terra Ensacada (HiperAdobe).
O 3º curso foi ministrado pelo Hélio Atayde e
tivemos a participação da Diana Cianelli (educadora) como facilitadora, onde
executamos as técnicas de Tijolos Terra-Palha e Fossa Ecológica, além das
diversas dinâmicas aplicadas com o intuito de reflexão e compartilhamento de
conhecimento. Todos os cursos tiveram as inscrições abertas e participaram do
curso pessoas de diversas regiões do Brasil e do Mundo, bem como moradores da
comunidade.
Somos imensamente gratos a todos, tanto
capacitadores quanto capacitados, pelo profundo empenho, dedicação e troca,
pois a obra já próxima a inaugurar foi possível graças à colaboração de todos!
BGN: Vocês acreditam que esta forma de construir é
mais econômica? Por quê?
D.O e T.J: Acreditamos, sim. Ao construir com os
elementos que temos ao redor, economizamos na compra de outros materiais de
mais alto custo. A terra, as madeiras e a palha são “ingredientes” que
substituem cimento, tijolos tradicionais e outros que, necessariamente,
teríamos que comprar em uma loja. Se você dispõe de paciência e vontade, com
certeza vai ter um custo muito menor do que com uma obra de alvenaria… No nosso
caso, calculamos que gastamos menos da metade.
BGN: Na opinião de vocês, qual o principal motivo
que levou a maioria das pessoas a deixar de construir com barro?
BGN: Na opinião de vocês, qual o principal motivo que levou a maioria das pessoas a deixar de construir com barro? |
D.O e T.J: Por imposição social e do mercado. Há no
imaginário que quem constrói com taipa é pobre e quem construí com tijolo é
rico. Essa é uma grande mentira, mas é difícil lutar contra os preconceitos
que, infelizmente, a sociedade adota como verdade. Mesmo assim, os moradores
das casas com construção de alvenaria, que já moraram em casas de barro,
elogiam as vantagem da construção com terra, onde o conforto térmico é um
grande diferencial.
Nos dias de hoje, o conhecimento que temos
acumulados nas mais diversas disciplinas, permite uma “releitura” da
BioConstrução, aplicando soluções que melhoram e solucionam alguns
inconvenientes que as construções mais antigas não sabiam como contornar.
Um exemplo disso é o uso de esterco de gado na
massa da taipa: o mesmo libera amônia, que é um repelente natural de insetos e
pragas. A palha na taipa, também é uma novidade para o povo da região, que não
utilizava. Elas são muito efetivas para evitar as trincas no barro.
O nosso objetivo é mostrar as pessoas que novamente
acreditem na BioConstrução através da vivencia em um ambiente mais térmico,
agradável e vivo.
BGN: Vocês acham que este tipo de construção poderá ajudar a fomentar o turismo na Barra Grande? |
D.O e T.J: As vantagens são inúmeras, além de maior
conforto térmico, ambientes mais vivos e saudáveis. A BioConstrução tem um
impacto ambiental muito reduzido, se comparado à alvenaria. E nos dias de hoje,
é importante termos esta preocupação. Vale ressaltar que a indústria da
construção é uma das principais fontes de poluição.
Poder participar da sua construção e desfrutar do
processo, juntamente com a equipe, amigos e voluntários, também é uma
experiência maravilhosa: cada cantinho da construção tem um pouco de cada um. A
BioConstrução é mais que as técnicas e soluções: é todo um conceito!!
BGN: Vocês acham que este tipo de construção poderá
ajudar a fomentar o turismo na Barra Grande?
D.O e T.J: Não podemos dizer que vai aumentar a
quantidade de turistas, pois isso vai acontecer com ou sem a BioConstrução,
mas, com certeza, a melhoraria, a qualidade e a diversidade do turista. O
povoado será um atrativo para aqueles que respeitam, valorizam e são
conscientes no que se diz respeito ao meio ambiente e não apenas um turismo
exploratório que não se importa com as questões de lixo, carros nas praias e do
impacto na comunidade local. Queremos atrair um público com uma consciência socioambiental
maior, que esteja disposto a troca, a cultura, que pensa em ecologia, que gosta
de natureza, que reflete sobre alimentação e é preocupado com a saúde e com o
mundo.
D.O e T.J: Ficamos surpresos com o impacto que está
tendo, sempre somos abordados para receber elogios e saber as novidades da
obra. Além disso, despertou na Barra Grande a questão da reciclagem do lixo, o
resgate das técnicas de construção antigas… e aproximou pessoas interessadas em
discutir e resolver os problemas da comunidade, tanto aqui quanto em outras
partes.
O impacto visual da obra atraiu pessoas locais e
turistas, que talvez nunca ouviram falar de BioConstrução para preguntar sobre
os processos, as técnicas… e se admiram com os resultados. Isso é muito
satisfatório e gratificante para nós. Estamos muito felizes em causar essas
reflexões.
BGN: Como descrevem sua experiência neste processo de BioConstrução há pouco dias de abrir as portas ao público? |
D.O e T.J: Maravilhosa… Excepcional!! Superou todas
as nossas expetativas. Ficamos surpresos de como pessoas das mais diversas
nacionalidades e de diferentes localidades do Brasil, chegaram a participar de
nosso projeto, atraídos pela proposta.
A convivência e o dia a dia com a equipe e os
voluntários são uma aprendizagem e uma troca permanente em todos os ângulos:
alimentação, cultura, compartilhamento das experiências e de energia. Todos que
passam, deixam um pouquinho. É simplesmente imensurável!
E o mais importante é que, de algum jeito, os
trabalhadores fixos, que são em sua totalidade jovens nativos, estão adquirindo
conhecimentos e valores que podem mudar suas vidas e, com isso, prover o
sustento para eles e suas famílias.
Fonte: barragrandenews.com.br
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