Dinheiro Público pelo ralo no Porto de Luís
Correia: defesa tentou anular delação premiada; Juiz federal manteve
homologação da delação que narra partilha de dinheiro na SETRANS.
- Magistrado se utilizou da teoria do domínio do fato para negar absolvição
sumária de ex-secretário. A teoria foi usada, de forma inédita, pelo Supremo
Tribunal Federal para condenar o ex-ministro José Dirceu no mensalão. Feito
defendido com veemência pelo então ministro Joaquim Barbosa.
Os advogados do ex-secretário de Transportes do
Estado do Piauí, Alexandre de Castro Nogueira, tentaram, ao apresentarem a
defesa do seu cliente, anular a delação premiada do então engenheiro-fiscal
Anderson Castelo Branco Lopes, que narrou com riqueza de detalhes a partilha de
dinheiro que ocorria dentro da Secretaria dos Transportes entre os anos de 2009
a 2010. A partilha era feita com verbas públicas que deveriam ter sido
empregadas no eterno Porto de Luís Correia.
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PARTILHA "JUSTA" COM O DINHEIRO PÚBLICO
Um dos trechos dessa delação diz: “(...) que nessa
oportunidade, Alexandre de Castro Nogueira afirmou que, para cada pagamento
destinado ao consórcio STAFF-PAULO BRÍGIDO, 1% (um por cento) caberia ao
Superintendente de Obras, e mais 2% (dois por cento) seriam do Secretário de
Transportes; Que, segundo Alexandre de Castro Nogueira, seria justo que esse
valor de um por cento continuasse com o Superintendente de Obras, no caso o
declarante, e não com o Diretor de Obras, como queria Heitor Gil Castelo
Branco".
Na decisão do juiz federal da Vara Única de
Parnaíba, José Gutemberg de Barros Filho, que refutou o que pleiteava a defesa
do ex-secretário, o magistrado demonstra de forma resumida o alegado pelos
advogados de Alexandre Nogueira para anular a delação premiada.
“O acusado, por sua vez, alegou, em síntese (...):
a) nulidade da decisão que deferiu a delação premiada por inaplicabilidade do
art. 156, inciso I, do CPP e ausência de necessidade, adequação e
proporcionalidade da medida judicial; b) desrespeito ao procedimento da delação
premiada, sob o argumento de que não há previsão de antecipação do
interrogatório”, destacou o magistrado.
COMO DECIDIU O MAGISTRADO
Sobre esse ponto, o pedido de anulação da delação
premiada no âmbito do processo envolvendo a “quadrilha” acusada de surrupiar
dinheiro público do porto piauiense, o juiz assim decidiu: “nada a prover
quanto à preliminar de nulidade da delação, sob o fundamento de que houve a
antecipação do interrogatório do delator, com a consequente inversão da ordem
de oitiva prevista no artigo 400 do Código de Processo Penal”.
“O artigo 156, inciso I, do Código de Processo
Civil ampara a antecipação de provas com base nos princípios da
proporcionalidade e razoabilidade. Ademais, referida preliminar já fora
refutada nos autos, inclusive ratificada no âmbito do Tribunal Regional Federal
em sede de habeas corpus”, complementou.
“Ainda quanto à antecipação do interrogatório do
colaborador, conforme exposto em audiência (...), há que se enfatizar que
inexiste prejuízo à defesa, na medida em que este ato permite acesso e
conhecimento aos termos da delação, em sede judicial, o que propiciará uma
melhor defesa no decorrer da instrução processual. Ausente, pois, a
demonstração de prejuízo, inviável o acolhimento da nulidade apresentado
genericamente”, acresceu o magistrado.
CITADA TEORIA DO DOMÍNIO DO FATO PARA AFASTAR
ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA
Adotada de forma inédita pelo Supremo Tribunal
Federal (STF), quando do julgamento de José Dirceu, condenado à época do
mensalão, a teoria do domínio do fato foi citada pelo juiz federal na decisão
que também refutou inépcia da denúncia de peculato feita pelo Ministério
Público Federal contra o ex-secretário de Transportes, Alexandre de Castro
Nogueira.
Pela teoria do domínio do fato, “é autor - e não
mero partícipe - a pessoa que, mesmo não tendo praticado diretamente a infração
penal, decidiu e ordenou sua prática a subordinado seu, o qual foi o agente que
diretamente a praticou em obediência ao primeiro. O mentor da infração não é
mero partícipe, pois seu ato não se restringe a induzir ou instigar o agente
infrator, pois havia relação de hierarquia e subordinação entre ambos, não de
mera influência resistível”.
A menção à teoria foi feita após a defesa do
ex-gestor sustentar, segundo os escritos na decisão do juízo, que “em relação
ao crime de peculato, alega [os advogados] que não restou demonstrado o
elemento subjetivo específico do acusado em causar dano ao erário e obter
vantagem ilícita, arguindo, ainda, o princípio da confiança, sob o fundamento
de que os engenheiros fiscais eram os responsáveis pelas medições”.
Mas assim decidiu o juiz: “sem razão os argumentos
do denunciado. Isto porque, no momento, há indícios de autoria e materialidade
delitiva que apontam que o mesmo, à época, na qualidade de Secretário, era quem
determinava aos engenheiros fiscais para atestarem e assinarem os boletins de
medição ideologicamente falsos (teoria do domínio do fato) – fundamentos de
suposta existência de superfaturamento da obra”.
“Reforçam os indícios os termos da delação premiada
[aquela que a defesa do acusado tentou anular] prestada pelo acusado Anderson
Castelo Branco (...), vejamos: ‘que já conversou com o Marlus e o Alexandre
sobre essa questão, sendo que o último visitava diretamente a obra, de forma
que afirma que o mesmo tinha conhecimento técnico para entender esse
procedimento”, pontua o juiz federal José Gutemberg de Barros Filho.
DESVIO DE QUASE R$ 5 MILHÕES
As práticas nada republicadas na SETRANS nos anos
compreendidos entre 2008 e 2010 imputam ao ex-gestor a responsabilidade pelo
suposto desvio de R$ 4.908.161,67, além de vários crimes, entre eles o de
formação de quadrilha ou bando.
Além de Alexandre Nogueira, há vários outros
respondendo perante a Justiça.
LEIA TRECHOS GRAVES DA DELAÇÃO:
Por Rômulo Rocha/180graus | Edição: Jornal da Parnaíba
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