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Blitz Lei Seca |
As polêmicas em torno da nova lei seca já
começaram: um delegado de polícia em Goiás (ver site do G1) deixou de autuar em
flagrante um motorista embriagado alegando que a lei precisa ser regulamentada
pelo Contran. De fato, a nova lei (§§ 1º e 3º do art. 306) diz que o Contran (a)
vai especificar os sinais que indiquem a alteração da capacidade psicomotora e (b)
que vai dispor sobre a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia
para o efeito da caracterização do crime tipificado neste artigo.
De acordo com nossa opinião a lei é autoaplicável
(deve ser aplicada imediatamente, independentemente de novas regulamentações). Por
quê?
Equivalência
entre os testes de alcoolemia
No que diz respeito ao segundo ponto (equivalência
entre os distintos testes: exame de sangue e etilômetro) penso que a própria
lei resolveu o assunto: O inc. I, do § 1º, do art. 306, diz: “§ 1. As condutas
previstas no caput serão constatadas por: I – com concentração igual ou
superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a
0,3 miligrama de álcool por litro de al alveolar”. A própria lei fez a
equiparação. O Contran não pode contrariar o texto legal.
Quanto ao primeiro ponto Francisco Sannini Neto e
Eduardo Luiz Santos Cabette, delegados de polícia, explicam (no portal
Atualidadesdodireito.com.br) o seguinte:
“No inciso II do mesmo dispositivo surge o primeiro
deslize do legislador. Considerando que o tipo determina que as condutas do caput
serão constatadas por “sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo CONTRAN,
alteração na capacidade psicomotora”, muitos poderão entender que estamos
diante de uma norma penal em branco, o que, em última análise, impediria a aplicação
da nova Lei.”
“Com a devida vênia, o complemento a que faz menção
o dispositivo constitui apenas um plus ou um adendo aos outros meios de
constatação da embriaguez previstos no próprio tipo do artigo 306.”
“Isto, pois, no §2°, o legislador deixa claro que a
verificação da redução da capacidade psicomotora do motorista poderá ser obtida
mediante diversos meios de provas, tais como depoimento testemunhal, exame
clínico e até por vídeos. Por tudo isso, não concordarmos que se trata de uma
norma penal em branco. Além disso, para aqueles que não se satisfaçam com essa
explicação, é fato que está em vigor atualmente a Resolução CONTRAN n. 206, de
20 de outubro de 2006, a qual nada mais faz do que repetir as normativas já
delineadas no atual § 2º, do artigo 306, CTB de acordo com a nova redação dada
pela Lei 12.760/12. A verdade é que o recurso à Resolução do CONTRAN é
despiciendo mesmo. Isso porque quando se fala em prova penal, se está tratando
de matéria Processual Penal, cuja origem somente pode ser, por força
constitucional, lei ordinária federal. O CONTRAN não tem atribuição para
regular matéria de prova penal, não pode “legislar” sobre matéria processual
penal. Portanto, é de se concluir que o inciso II do artigo 306, CTB é
autoaplicável de acordo com as normas processuais penais referentes às provas,
sendo, como já afirmado acima, eventual Resolução do CONTRAN, mero adorno que
somente pode ter alguma maior utilidade no ramo administrativo. Seria mesmo
surreal imaginar o CONTRAN regulamentando prova pericial, prova testemunhal,
prova documental etc. na seara processual penal.”
“Em nosso entendimento, a regulamentação a ser
feita pelo CONTRAN teria como destinatários apenas os agentes de trânsito, que
se utilizariam deste ato normativo para decidir sobre a necessidade ou não de
encaminhamento do condutor do veículo até a Delegacia de Polícia.”
“Nesse ponto, destacamos que, sem embargo do
disposto no §2°, do artigo 306, de acordo com o Código de Processo Penal,
sempre que a infração deixar vestígios, é indispensável a realização de
perícia. Desse modo, mesmo diante de uma prova testemunhal ou de um teste de
alcoolemia, é necessário o encaminhamento do suspeito ao Instituto Médico Legal
para a realização do exame clínico ou de sangue. Essa obrigatoriedade da prova
pericial nos chamados “crimes de fato permanente” (“delicta facti
permanentis”), somente pode ser superada muito excepcionalmente nos termos do
artigo 167, CPP, acaso a falta da perícia não se dê por desídia dos agentes
estatais, mas por obra do próprio infrator.”
“Diante desse novo quadro, parece-nos que o exame
clínico constituirá o principal meio de prova da embriaguez, haja vista que o
médico legista é o agente mais indicado para avaliar o estado do investigado.
Assim, testemunhas, vídeos e outros meios de prova seriam utilizados apenas de
maneira subsidiária, quando não for possível a realização de perícia, de acordo
com o já citado artigo 167, CPP ou mesmo como coadjuvantes dos exames periciais
mais adequados.”
“Com o objetivo de ilustrar essa situação,
imaginemos o caso em que o suspeito se recuse a colaborar com o exame clínico
ou não possa fazê-lo em virtude dos ferimentos causados por um acidente. Em
situações como esta, a prova pericial poderá ser substituída por depoimento de
testemunhas ou por vídeos. Também nada impede que sendo realizadas as perícias,
também se colham provas testemunhais, vídeos, fotos , objetos apreendidos etc.
a fim de reforçar o arcabouço probatório.”
Resolução
206/2006 do Contran
A Resolução 206/2006 do Contran, de fato, determina
que o agente público, no momento em que se depara com um condutor suspeito,
faça o seguinte:
Relato:
a. O condutor:
i. Envolveu-se em acidente de trânsito;
ii. Declara ter ingerido bebida alcoólica;
Em caso positivo, quando:
iii. Declara ter feito uso de substância tóxica,
entorpecente ou de
efeito análogo.
Em caso positivo, quando:
iv. Nega ter ingerido bebida alcoólica;
v. Nega ter feito uso de substância tóxica,
entorpecente ou de
Efeito análogo;
b. Quanto à aparência, se o condutor apresenta:
i. Sonolência;
ii. Olhos vermelhos;
iii. Vômito;
iv. Soluços;
v. Desordem nas vestes;
vi. Odor de álcool no hálito.
c. Quanto à atitude, se o condutor apresenta:
i. Agressividade;
ii. Arrogância;
iii. Exaltação;
iv. Ironia;
v. Falante;
vi. Dispersão.
d. Quanto à orientação, se o condutor:
i. sabe onde está;
ii. sabe a data e a hora.
e. Quanto à memória, se o condutor:
i. sabe seu endereço;
ii. lembra dos atos cometidos;
f. Quanto à capacidade motora e verbal, se o
condutor apresenta:
i. Dificuldade no equilíbrio;
ii. Fala alterada;
Afirmação
expressa de que:
De acordo com as características acima descritas,
constatei que o condutor [nome do
condutor] do veículo de placa [placa do veículo], [está/não
está] sob a influência de
álcool, substância tóxica, entorpecente ou de
efeitos análogos e se recusou a submeterse
aos testes, exames ou perícia que permitiriam
certificar o seu estado.
Conclusão: Come se vê, o tema já está todo
regulamentado. Logo, de acordo com nossa opinião, não cabe à autoridade
policial negar aplicação à lei nova, sob a alegação de falta de regulamentação
pelo Contran.
Autor: LUIZ
FLÁVIO GOMES (@professorLFG)*
*LFG – Jurista e professor. Fundador da Rede de
Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil e coeditor do
atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de
Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Siga-me: www.professorlfg.com.br.
Edição de José Wilson Albuquerque Santos Júnior –
Bacharel em Direito pela UESPI
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