quarta-feira, novembro 14, 2012

Praça da Graça: Seus Tipos Populares

Foto antiga da Praça da Graça

Era uma verdadeira vitrine, durante todas as horas do dia. Do amanhecer ao anoitecer, todo mundo achava um pretexto de passar por lá. Durante o dia os escolares, faziam grande alarido entre os intervalos de suas aulas. Os viajantes desocupados assinavam o ponto. Donas de casa que iam ao comércio e caixeirinhas sonhadoras se cruzavam. Fim de tarde os bancários se dirigiam para a AABB, e os primeiros namorados apareciam. Ao anoitecer o pessoal que se destinava ao Éden, desfilava por lá. Se a noite era de retreta, ao som da "furiosa" os flertes se sucediam. As donzelas casadouras volteando sem parar, escolhendo ou tentando ser escolhidas. Era uma verdadeira caçada. Depois das nove, quando não havia tertúlia na AABB, "soltavam se as onças". Moça que se prezava, sumia. Ficava a Praça à nossa disposição, com nossos bancos naturalmente reservados. É claro havia seus tipos populares. Toda cidade que se preza tem os seus e Parnaíba, não era uma exceção. Muito pequeno, não compreendia por que troçavam e assobiavam quando ele passava. Miúdo, atarracado, usando roupas esquisitas, e rebolando muito. "Menino deixa de ser danado ou te entrego pro Chico Devasso". Foi o primeiro homossexual assumido que vi. Sequer lhe ouvi a voz. Na sua esteira, muitos outros viriam depois. De todos os tipos que conheci, o mais assiduo nas nossas rodas da Praça, era o Domingão. Tipo baixo, truculento, de grande força fisica. Repetia tudo o que lhe ensinavam a exaustão. Além de tudo, uma gagueira atroz lhe perseguia. Vinha de familia remediada e chegar a estudar no melhor internato da cidade. Nunca soube porque as coisas desgringolaram, e ele pirou de vez. Suas melhores e piores coisas da vida, marcaram uma época.

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Muitos perdiam horas a ensiná-lo, assim como quem "leciona" papagaio. "Zé, Zé as melhores coisas da vida são: primeiro correr como carro novo. Segundo casar com dona fulana (alguma solteirona cheia de dinheiro, que algum maledicente tinha lhe enfiado na cabeça) e muito mais "Ele não se fazia de rogado quando solicitado, desfiava sua lista sem nenhuma pausa. Sempre havia algum mais afoito, a lhe contar fatos apimentados sobre algum de nós, seus ouvidores habituais. Porém, o diabo do homem não podia ser interrompido, pois tinha que começar tudo de novo. Cansava. A Maria Onça, figura feia, de uma lealdade comovente, que era especializada em contar casos, e beijar, quando devidamente encomendada e bem paga, a alguma figura desprevenida, que ficava furiosa com aquele carinho extemporâneo.

O Caboré, tipo grotesco, fazia jus ao nome. Quase um Quasimodo à Tupiniquim. Certa feita, um Prefeito deportou todas as bichas da cidade, e no meio delas, por maldade colocaram o Caboré. Era de dá dó ouvir suas reclamações, vociferadas em altos brados, dizendo que não pertencia àquela corja. O João Ventura, caboclo matreiro, misto de Jeca Tatu com cabeça de Maquiavel, sabia da vida de todo mundo. Não sei qual a sua fonte de informação, porém os "podres" de todos os grandes da cidade, eram com ele. Quando estava a fim de grana, chegava à porta do estabelecimento ou residência de sua vitima e mandava o seu discurso. Claro que num piscar de olhos, algum serviçal surgia com o dinheiro providencial, e o despachava pra cantar noutra freguesia. Não sei, se tudo o que dizia era verdadeiro, mas que incomodava, lá isso era certo. Quando brigava com algum grande, sua vingança e praga era mijar na futura cova do infeliz. Sei de muitas promessas que ele cumpriu...

Crônica transcrita do Livro "Estórias de uma Cidade Muito Amada" de Carlos Araken
Edição do Jornal da Parnaíba | Publicado no Facebook de Helder Fontenele
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